Pequenos Americanos #04: Fogos de Ano Novo - 1 de 2


   E enfim havia chegado ao ano novo e eu estava louco para sair com a família Cooper. Em todo ano novo uma contagem dos últimos segundos era feita em um telão na Times Square e depois começava a tocar o clássico Audy Lang Syne, e era sempre televisionado. Milhões de pessoas se reuniam lá todos os anos e o comercio abria excepcionalmente, mesmo sendo tarde da noite. Simplesmente não havia uma única razão humanamente pensável, estando em Nova York, para não ir prestigiar o evento.
   -Você não vai! - O senhor Cooper me avisou de manhã, enquanto lhe servia os ovos e o bacon como de costume. Naquela manhã também fiz batata recheada para fazer uma média com a chefia. Eu andava sendo mais legal que de costume, pelo natal que passei com os meninos e com Pete naquela semana.
   -Posso ir de metrô e encontrá-los lá, senhor!
   -Não é por isso! - Me chamou pelo nome. - É por causa do Noah, ele tem pavor de fogos de artifício! Se encolhe e começa a chorar! É pior que cachorro! Vai ter que ficar com ele em casa acompanhando pela TV! Talvez me veja beijar a Christine! - Disse, num tom de deboche, se referindo a senhora Cooper.
   Isso não era bom. Não só por ele estar sendo completamente insensível quanto ao medo de Noah, mas porque mesmo nas proximidades da casa algumas pessoas soltavam fogos, então mesmo assim ele não ia escapar. Mas tive uma intuição de não perguntar mais nada a ele. E os meninos iam acordar logo, então tinha de voltar e preparar o café da manhã deles.

* * *
   Dois anos antes um acidente horrível aconteceu. Naquela época, ainda um adolescente na sua fase mais chata, Ollie tinha uma mania muito desagradável de gastar suas moedas com bombinhas para brincar, principalmente com os pais trabalhando. Até aí tudo bem. Mas, naquele ano, ollie não foi o único a pensar em explosivos. Marcus também tinha comprado alguns para soltar nos fundos da casa, para encher os olhos da vizinhança. E esse foi o começo de todos os problemas.
   Nessa época Noah tinha acabado de fazer seus oito anos. E Ollie tirou aquele dia de ano novo para, como todo irmão mais velho, tirar a paciência do irmãozinho, e qual melhor jeito que com as bombinhas? A chance veio quando Noah foi buscar algum brinquedo na garagem, e portanto, nenhum dos pais iam ver. Ollie correu antes, preparou umas três ou quatro bombinhas no chão, e se escondeu em um canto. Só que Ollie, meio burro, esqueceu que aquelas bombinhas são do tipo que soltam pequenas faíscas. E também não lembrou que os fogos de artifício do pai estavam ali, já prontos e montados para mais a noite, faltando apenas serem levados para os fundos e acesos. E o cenário estava armado.
   Para uma criança de oito anos nem tem o que descrever. É como se o mundo começasse a explodir e cair em volta dele. Como um colorido, barulhento e assustador big bang acontecendo diante dos seus olhos. O que só acabou quando Ollie correu para tira-lo de lá, felizmente, o salvando de um pequeno incêndio que começou ali. E que Christine percebeu bem a tempo de pegar o extintor e impedir que as perdas materiais fossem mais sensíveis que alguns fogos. E Christine nunca contou a história toda a Marcus, para ele não castigar os meninos. Mas ela mesma deixou Ollie uma semana sem videogame e sem sair de casa. Quanto a Noah, o resultado terrível foi esse que conhecemos.

* * *
   Por alguma razão, descobri no natal que música fazia ele acordar mais alegre e mais bem disposto. Entrei no quarto cantando Auld Lang Syne, já para colocá-lo no clima de hoje a noite. Já estava cogitando até colocar tampões nos ouvidos dele, embora já desconfiasse que não ia funcionar. Os fogos explodiram na frente dele, o trauma não era apenas pelo auditivo. Me sentei na cama dele. Saiu de debaixo das cobertas e se sentou, deixando ver o pijama branco. Colocou os óculos.
   -Bom dia, tio!
   -Bom dia, Noah! Seu pai me falou sobre o seu problema com os fogos! Disse que vamos ficar em casa hoje!
   -Tudo bem, todo ano eu fico em casa com a Au Pair vendo TV!
   -Não parece muito justo!
   -Eu não quero sair! É horrível! Dá medo!
   A expressão de rosto que ele fez realmente confirmava. O que tinha acontecido era forte o suficiente para ele concordar em perder um dia como aquele.
   -Mas, você vê sempre as pessoas felizes! Não dá vontade de sair?
   -Não! E se um dia em vez de explodir no céu aquilo cai e explode na gente?
   Era no mínimo triste olhar para ele naquela situação. Não era justo perder um dia maravilhoso como aquele com a família por isso e ser abandonado em casa com o au pair. O au pair era transitório, mas a família seria para sempre, seria pelo resto da vida. Já tinha ouvido a história mas não tinha pensado muito nisso, porque, ao contrário do Brasil, em Nova York não se solta fogos para qualquer coisa. E eu não sabia, até então, que esse tipo de coisa acontecia, sobre ele ser excluído do passeio de ano novo. Aquilo me fazia mal demais por dentro.
   -Noah, os fogos são lindos quando você vê no céu, tá? O que aconteceu aquele dia, só aconteceu aquele dia, porque seu irmão foi um idiota com você! Não seria legal te assustar com bombinhas em lugar nenhum! Olha, se eu for junto com você, se eu te proteger, se eu prometer que a gente vai embora se você realmente não gostar, você vem comigo?
   -Pode ir, tio. Tudo bem. Eu fico quietinho vendo TV.
   -Não, Noah! Você esqueceu como isso é legal! Eu quero que você descubra isso de novo!

   Continua...

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Isso tudo já acontece a décadas todo final de ano na Times Square em Nova York, e abaixo vocês podem ver como foi em 2011 o evento:


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