As horas foram se passando. Felizmente, a casa estava limpa porque andei adiantando algumas coisas para ficarmos livres hoje e fazer algumas coisas com os meninos. Mas aquilo me deixou completamente sem vontade de fazer muita coisa. E Ollie como sempre sentado no sofá, conversando com alguém no celular. Eu poderia até sentir alguma raiva dele por ter tirado o ano novo do irmãozinho, mas não conseguia. Porque apesar de tudo gostava dele tanto quanto de Noah, e também porque ele chegou a pedir desculpas na época, então eu não podia lhe cobrar mais nada. Me sentei no braço do sofá.
-Ollie?
Escondeu rapidamente a tela do aparelho.
-O que é?
-Eu quero falar com você. Nunca me contou que seu irmão é excluído das festas de ano novo por causa do medo dele!
-Mas eu te contei isso há dois meses! A última coisa que estava pensando em outubro era no ano novo!
-Principalmente por causa das notas baixas, né? - Provoquei.
-Eu não sabia que as bombinhas podiam acender os fogos! Mas eu tirei ele de lá antes que o incêndio começasse!
-Ainda não pagou por tudo, Ollie! Precisa me ajudar a pensar em como posso fazer isso com ele! Como posso ajudá-lo a lidar com o trauma! Pelo menos conseguir controlá-lo e poder se divertir com vocês lá!
-Eu entendi! - Sussurrou. - Eu também não ia querer passar o ano novo preso em casa com ele!
-Não é isso! Não é sobre mim! Eu realmente queria ver como são as comemorações de ano novo da Times, mas isso é sobre ele! Isso é sobre a família de vocês! E eu sei que sou só um Au Pair, mas meu trabalho é cuidar de vocês, e se ele não está feliz, a responsabilidade também é minha! Mas ela também é sua, porque você provocou isso naquele dia! E você fez bem em tirar ele de lá quando os fogos começaram a explodir, mas precisa terminar de corrigir isso!
-Porque?
-Porque se não fizer isso eu conto toda a verdade sobre aquele dia ao seu pai! E aí, eu tenho certeza que não vou ser o único que vou ficar preso nessa casa com ele no ano novo!
-Você não faria!
-Duvida? - Me levantei.
Na verdade ele estava certo. Já trabalhava ali a tempo suficiente para saber o quanto Marcus era severo, principalmente com os filhos. Não arriscaria jamais provocar a ira dele para com Oliver, principalmente para uma vingancinha. Além disso, eu era o au pair, e era no meu turno que isso estava acontecendo, e portanto, não sabia quanto ao futuro, mas o que aconteceria com os dois naquela noite ainda seria minha responsabilidade.
-Não, por favor! - Se levantou também.
-Certo! - Puxei a carteira. - Vamos aproveitar que seus pais estão visitando seus tios! - Estendi alguns dólares para ele, de meu próprio salário. - A sua parte é comprar fogos. E colocá-los no quintal onde eu vou mandar depois! O resto eu vou fazer!
* * *
Eu não tinha certeza se ia dar certo. A única coisa que eu sabia era que Noah apenas tinha visto os fogos no céu ou explodindo muito perto dele, mas nunca viu todo o processo de se soltar fogos. Depois de me certificar de que não haviam cachorros na vizinhança, a maioria viajando com os donos, levei o Noah para fora. Em seguida, me abaixei e segurei sua mão.
-Tá vendo aquilo ali, Noah? - Apontei para algo no chão a três ou quatro metros de nós.
-O que é?
-Um fogo de artifício azul armado! E ali tem um vermelho, e ali um amarelo! Eu quero que você veja o quanto é bonito, mas eu quero que você veja dessa vez com segurança e do jeito certo! Do jeito que é bonito e que acontece na Times Square! Eu juro que vai valer a pena, se você deixar!
-Não, eu não quero ver!
Ele escondeu o rosto na minha camisa, e pude notar que começava a lacrimejar. E isso mostrava o nível do trauma. Nem sequer tínhamos acendido os fogos. E eram pequenos perto daqueles que realmente costumavam ser soltos.
-Eu vou segurar a sua mão, as duas! - Sussurrei. - E se alguma coisa der errado, eu vou tirar você de perto e te levar para dentro de casa! Você confia em mim, Noah?
Fez que sim com a cabeça. E eu consegui ver os olhos molhados.
-Você pode tentar? Por mim?
-Mas...
Não pude dizer mais nada além de encará-lo compreensivamente. Não era meu plano forçá-lo. Eu sabia, mesmo depois de gastar um pouco mais do que devia com aqueles pequenos fogos, que isso poderia até piorar. Além do fato de que ele nunca mais confiaria em mim. E por melhor que realmente fossem minhas razões, de fato estava pondo toda a relação que construí com Noah em risco, literalmente pondo uma corda no meu pescoço nesse sentido. Mas também podia dar tudo certo.
-Tá. - Ele disse, enfim.
Então o abracei por trás e segurei suas mãos, em posição para tira-lo o mais rapidamente possível dali se começasse a chorar de novo ou qualquer outra reação.
-Ollie, pode acender!
-Que fique claro que eu estou fazendo isso sob protesto!
Ele então acendeu os três. Abracei Noah ainda mais forte. O sentimento mais forte dentro de mim era justamente de fazê-lo sentir-se protegido, mesmo diante de algo tão assustador. Ele pressionou o corpo para trás no sentido de recuar ao ouvir o som dos fogos subindo. Isso era bom. Ele não estava tentando se retirar ou fugir e nem esconder o rosto. Apenas recuar. E então eles explodiram. Não tinha muito de majestoso ou bonito nos fogos a luz do dia. Mas ainda assim, ele os viu.
-De longe... Não é tão ruim. - Murmurou.
-Eu estou muito orgulhoso de você! - Me abaixei e o virei para mim. - Você foi muito corajoso! Você podia fugir, mas enfrentou!
-Obrigado, tio! - Sorriu, nos cantinhos da boca.
-Quer fazer isso de novo? Quer ver alguns bem maiores e que vão subir bem mais alto antes de explodir?
-Você vai estar lá, né?
Confesso que dei uma rápida travadinha. Isso foi bastante inesperado. Tanto quanto foi bom de ouvir.
-Mas tem um problema! - Ollie avisou, me chamando pelo nome. - Eu fiquei de encontrar os meus pais lá na Times Square mais tarde de taxi! Não tem como avisar ele a tempo para levar o Noah!
-Se vocês não vão leva-lo, eu vou! - Avisei.
-Mas o meu pai...
-"Vai ter que ficar com ele acompanhando pela TV!". Essa foi a ordem dele! Pois vou ficar com o Noah lá na Times Square acompanhando a contagem pelo telão, que por definição também é uma TV! E claro, não estaremos com vocês lá e sim do outro lado da avenida, de forma que seu pai também não vai ter que se preocupar com ele! Só confie em mim, Ollie!
* * *
Tinha finalmente chegado a hora e estávamos todos lá na Times Square. Assim, Marcus e Christine, os pais deles, estavam em um dos lados da avenida esperando para ver os fogos, eu estava com Noah e outro, e Oliver esperava por alguém na área externa de um barzinho que havia ali.
-Não quis ficar com seus pais? - Se aproximou e se sentou a mesa com Ollie.
Dali, podia se ver o prédio onde poderia ser vista a contagem, daqui a uns poucos minutos. E era mais confortável assistir a contagem de lá enquanto se comia qualquer coisa.
-Não! Talvez eu esteja um pouco velho para isso! Outro ano novo olhando eles se beijarem, acho que não!
-Tem razão, você não é mais só o menino deles! Você é o meu garoto agora! - Provocou.
-Eu admito, nunca tinha sonhado com alguém como você, mas você tem charme!
A mão pousa sobre o pescoço de Ollie e o puxa para si. A contagem está perto de começar.
-Quer um ano novo interessante, não quer?
-Ah, você não me deixa outra escolha!
Ouve-se a multidão começar alto a contagem pelo vinte. Se abraçam.
* * *
-É agora, Noah, está pronto?
-T-tá! Tudo bem!
-Não tem como os fogos caírem aqui, tudo bem? Nós estamos bem longe deles! Mas você vai ver de novo como é bonito e vai se lembrar de quando era pequeno!
A contagem começou. Dessa vez, apenas seguramos as mãos um do outro. Se isso o deixava mais tranqüilo, depois de três anos longe dos fogos, o que para ele é uma vida perto de seus nove anos de idade. Mas, dessa vez, os números reduziam cada vez mais e podia sentir, tocando em suas pequenas mãos, que ficava um pouco mais ansioso a cada número, mas ainda assim controlava-se e lutava para continuar olhando para o céu.
-Vai ficar tudo bem, não é, tio? - Ele me diz. 5 segundos restando.
-Se não ficar, a gente faz ficar! Desde que estejamos juntos com quem a gente gosta! - Respondo. 3 segundos.
Em seguida, o abraço forte, pronto para leva-lo dali se fosse necessário. E apenas esperamos em silêncio. Não tinha como prever nada que vinha por aí em frente. E o futuro como sempre dava medo e precisávamos ser fortes e ter esperança. De repente, se pudéssemos ter força para encarar de frente, quem sabe ainda não fosse tão ruim quanto parecia. Quem sabe talvez até valesse a pena.
.
--------------------
E esse é o último post do ano de 2018 do blog, ano em que completamos dois anos desse projeto maravilhoso, sendo que mais de um ano nessa plataforma. E só temos a agradecer a todos vocês e a cada leitor que torna isso possível e para mim, uma experiência maravilhosa e que (terceira pessoa a parte) é uma das coisas que dá sentido a minha vida! Em 2019, muita coisa legal e nova vem por aí, então esperamos contar com todos vocês! FELIZ ANO NOVO!
.
.